SALA DE LEITURA

Softwares piratas e a responsabilidade do empresário

por Luiza Guimarães*

A pirataria online é um crime comum no Brasil. Segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), cerca de 41% das pessoas com acesso a internet haviam cometido algum ato de pirataria no início da década passada. O uso de softwares piratas, ou seja, uso de programas de computador sem que haja o devido pagamento ou autorização de seu desenvolvedor, está nesse número.

A Lei 9609/98, conhecida como Lei do Software, regula o uso de programas de computador no Brasil. É ela que prevê também punições para os casos de uso de softwares piratas. Segundo essa lei, o infrator poderá sofrer pena de reclusão de 1 a 4 anos, ou multa. 

Caso qualquer pessoa utilize a rede de uma empresa para atividades ilícitas, incluindo o uso de softwares piratas, a responsabilidade não é só de quem cometeu a infração, mas pode também ser do empresário. Isso acontece pois, de acordo com o artigo 932 do Código Civil, o empregador é o responsável pelos atos praticados por terceiros em sua empresa. 

Esse assunto ainda é desconhecido por muitos empresários, por isso, é importante se manter atento a quem utiliza a rede da sua empresa. Quem nunca foi a um local público e usou a Wi-Fi? Se oferecer sinal gratuito de internet para clientes e funcionários já era considerado gentileza, hoje é praticamente obrigação. 

Por isso, esse é um assunto que requer atenção redobrada. Confira algumas reflexões sobre o assunto na entrevista com a advogada Carolina Kantek.

Como o uso de softwares piratas, por parte de terceiros, pode afetar o empresário?

Carolina Kantek – Pode afetar o empresário de duas maneiras. A primeira é caso ele não cuide para que todos os softwares que ele utilize em sua empresa estejam devidamente licenciados, seja gratuitamente ou de forma onerosa. Agora, mesmo que ele tenha todo o controle de sua rede, caso um terceiro venha a utilizar um programa pirata, mesmo que instalado em máquina de terceiro, o empresário pode se tornar responsável solidariamente. Ou seja, ele pode ser responsabilizado junto com o infrator, pelo crime e pelos danos patrimoniais e morais supostamente gerados em função da conduta do terceiro. Esse terceiro não precisa nem ser funcionário da empresa. Caso qualquer pessoa utilize a rede Wi-Fi corporativa compartilhada, o empresário, que não tome o cuidado devido, se torna responsável solidário pelos atos cometidos ali.

Essa responsabilidade vale apenas para a pirataria ou para qualquer atividade ilícita realizada através da rede da empresa?

Carolina Kantek – Para os outros comportamentos você teria que analisar a legislação própria. A Lei 9609/98 fala sobre softwares. Se você fala de postagem de conteúdo difamatório em redes, aí tem a questão da responsabilidade por calúnia e difamação, por exemplo, ou no caso de hackers, tem a questão da invasão de privacidade. Quem assume a responsabilidade é sempre quem praticou o ato, mas, se a pessoa estiver usando a rede e o sistema da empresa, o empregador tem parte da responsabilidade. Mesmo sem que ele soubesse, ele forneceu o espaço e, pelo menos até que prove o contrário, os meios para o crime. 

Sabendo da existência dessa responsabilidade, como o empresário pode ficar mais atento ao assunto dentro da própria empresa?

Carolina Kantek – O empresário pode exigir que cada pessoa que usa sua rede de internet declare que não utiliza programa pirata.  Esta declaração não impede que o empresário possa ser responsabilizado caso ocorra crime em sua rede corporativa, mas essa ação poderá beneficiá-lo na defesa. Fica mais fácil identificar quem foi a pessoa que cometeu o crime ou gerou o dano. Na pior das hipóteses, o empresário pode ser responsabilizado e depois cobrar o prejuízo da pessoa que de fato cometeu o ato ilícito. Também há possibilidade de criação de diferentes redes de acesso dentro da empresa: redes para computadores, redes para celulares, redes para convidados, etc. Uma boa orientação de TI pode ajudar muito. 

Como funciona a notificação do empresário em casos de softwares piratas?

Carolina Kantek – O que a gente vê hoje é que o titular do software, em alguns casos, não busca só verificar se houve crime, mas ele quer saber quem está cometendo o crime. Não parece ser exatamente uma punição que as empresas de software querem. Parece haver uma abordagem mais comercial, embora baseada na própria Lei do Software, você paga um valor em troca dela não levar a denúncia de crime adiante. E aí acontece uma situação muito delicada: De um lado, o terceiro cometeu crime de pirataria dentro da empresa , sem que o empresário tenha a menor possibilidade de controle, pois, mesmo com a prevenção  ele não tem como ter controle absoluto, e do outro lado tem o dono do software que vem com uma aproximação super agressiva, então o empresário fica muito vulnerável.

Na sua opinião, por que esse é um assunto que requer atenção, não só dos empresários, mas de toda a população?

Carolina Kantek – Existe a questão da vulnerabilidade técnica. O empresário, na maioria das vezes, não conhece a linguagem dos programas de computador. Algumas empresas de software, servindo-se desse analfabetismo tecnológico por parte do empresário, acabam alavancando vendas em cima disso. Quando você se coloca no lugar do desenvolvedor do software, aquele que investiu tempo, dinheiro e criatividade no produto para que alguém simplesmente o utilize sem pagar, ou sem a devida autorização, é fácil concordar com as severas punições que a Lei do Software traz. Mas agora temos que fazer um contraponto: no caso de pirataria cometida por terceiros, como vamos fazer para nos precaver, para um crime que não é meu, é do outro? Embora a lei traga a possibilidade de responsabilizar todos, é importante lembrar que a mesma lei dispõe sobre as atividades preliminares de vistoria na empresa e após, e também por determinação judicial, a busca e apreensão, tudo no intuito de se produzir a prova. Há, no entanto, e as vezes justificadamente, uma conduta mais agressiva por parte daqueles que buscam a reparação. A verdade é que o empresário de hoje tem a responsabilidade de estar mais atento com as questões tecnológicas. Tem que ter uma TI sólida ao seu lado, e ainda, tem que estar muito atento aos contratos firmados com os terceiros, principalmente aqueles  contratos que trazem pessoas para dentro das empresas. É imprescindível que estes contratos contenham garantias de não utilização de softwares pirata e também de responsabilização.

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*Comprometida com a democratização dos conceitos jurídicos a Pereira, Dabul Advogados Associados concede uma série de entrevistas para a jornalista Luiza Guimarães**. Em linguagem acessível, os artigos pretendem colocar em debate temas que preocupam o empresariado. 
**Luiza Guimarães é mestranda em Comunicação Social pelo PPGCOM da Universidade Federal do Paraná, especializada em Jornalismo Internacional Digital pela Université Lumière Lyon 2, na França. Formada em Comunicação Social, com habilitação em jornalismo, também pela UFPR.

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