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Sim, eu aceito cookies: LGPD, liberdade e privacidade

Uma forma de proteção e do exercício de direitos fundamentais, em especial do direito à liberdade e à privacidade. Será mesmo? A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, a celebrada por uns e temida por outros LGPD, tem por objetivo assegurar e promover a proteção dos direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. Em que consiste na prática tal promoção e defesa? Veja-se o exemplo corriqueiro para quem navega pela internet: de maneira adequada à LGPD, as empresas questionam a quem navega em seus websites a autorização para se prosseguir com a instalação de cookies nos dispositivos. O fato de se dar o “ok” para esse procedimento protege seu direito à liberdade e o livre desenvolvimento da personalidade?

Difícil esta resposta. GDPR e LGPD são iniciativas louváveis. Na prática, a atitude mais visível ao usuário de plataformas online está na autorização para utilização de seus dados que é concedida sem muita resistência ou consciência. De fato há que se pensar numa educação para a Inteligência Artificial e isso porque, liberdade, privacidade e livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural são princípios que na prática dependem da consciência do indivíduo acerca de suas escolhas. Não considero que o ato de dar um simples ok sem que o usuário consiga entender com o quê de fato anui seja uma forma de realização dos princípios pretendidos pela legislação.

A escolha livre, já dizia Eros Grau, pressupõe a consciência das escolhas e os acesso aos meios para realizar ditas escolhas, o binômio “senso e acesso” são pressupostos da liberdade. A formação do conhecimento livre pressupõe o acesso a uma gama diversa de informações e pensamentos. Não parece que a LGPD vem auxiliar nessa formação, pelo menos não de maneira imediata; novamente, louvável a criação de normas de proteção aos direitos fundamentais da pessoa, mas não se pode relaxar e entender que estamos protegidos. Ao contrário, ao autorizarmos, expressamente o “bombardeio” de informações definidas por Inteligência Artificial, que são adequadas à este ou àquele indivíduo, navegamos em terreno perigosíssimo. 

É certo que os robôs que operam a Inteligência Artificial estão além da compreensão daqueles não afeitos à tecnologia. Até mesmo para aqueles que têm a tecnologia como sua área de atuação existem questões que são sensíveis e de extrema complexidade. 

Temos muito ainda a realizar em termos de aplicação da legislação que está aí, no entanto, é fundamental que se jogue luz ao debate de modo que se possa descer ao seu bojo. Pessoas vivendo em bolhas criadas por seres não humanos, este é o perigo da errônea aplicação da LGPD (compatível com o resultado de sua ausência).

Temas discutidos hoje em países onde a legislação já está em vigor há mais tempo dizem respeito a adequação da legislação hoje existente. Em face, justamente, do crescimento da Inteligência Artificial, são estas algumas das questões discutidas no âmbito da GDPR e que já deveriam ser consideradas por aqui também:

  • Mesmo com a entrada em vigor da GDPR e aqui da LGPD, continuamos sendo bombardeados por propagandas online e continuamos entregando livremente nossos dados através de nossos hábitos de browsing. Por que as leis de proteção de dados são ineficazes neste ponto? Por que continuamos a entregar a matéria prima, traduzida por nosso comportamento online, livre de qualquer custo para tantas entidades que irão obter resultados financeiros com a comercialização de nossos hábitos individuais?

  • Como se sabe a personalidade pode ser jurídica ou natural; diante da realidade e do nível de desenvolvimento da inteligência artificial deveríamos começar a discutir a personalidade a ser atribuída a entes inteligentes não humanos? Não se trata de divagação ou de filosofia, nem tão pouco de algo que somente no futuro irá nos preocupar. Em diversos países hoje já se discute e se acessa, por exemplo, o novo mercado das seguradoras de automóveis em face dos chamados carros autônomos. Se eles podem ser considerados mais seguros que os automóveis dirigidos por pessoas, ainda assim há que se discutir a responsabilidade em caso de sinistro, as características do veículo e o nível de proteção e de autonomia quando se trata de proteger o indivíduo que ocupa outro veículo, por exemplo.

  • Em termos de proteção ao direito à privacidade e à intimidade do indivíduo, a LGPD parece atender muito mais este aspecto trazendo multas e procedimentos tendentes a garantir a proteção do indivíduo, o que é um passo grande na proteção ao vazamento de informações. Em alguns países, no entanto, questiona-se hoje, por exemplo, se estados de pandemia deveriam ser o suficiente para mitigar a aplicação de legislações de proteção individual em face da saúde pública.

Inúmeras são as questões pertinentes ao tema, o debate apenas se inicia. A iniciativa legislativa é louvável e deve ser comemorada mas o debate não pode parar.

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por Alessandra Dabul
*edição por Luiza Guimarães
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*Luiza Guimarães é mestre em Comunicação Social pelo PPGCOM da Universidade Federal do Paraná, especializada em Jornalismo Internacional Digital pela Université Lumière Lyon 2, na França. Formada em Comunicação Social, com habilitação em jornalismo, também pela UFPR.

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