SALA DE LEITURA

Compliance, Lei Anticorrupção e Programas de Integridade

A Lei nº 12.846/13 ficou conhecida como Lei Anticorrupção. Ela trouxe uma importante ferramenta no combate da corrupção, que tanto impede o crescimento de nosso país: a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Esta Lei é aplicada a todas “as sociedades empresárias e as sociedades simples, personificadas ou não, independente da forma de organização ou modelo societário adotado”, nos termos do seu artigo 1ª. 

Inspirada em regulamentações internacionais, especialmente na legislação norte americana FCPA (Foreign Corrupt Practices Act) e na britânica UBA (UK Bribery Act), a lei brasileira tem por objetivo responsabilizar agentes que fomentam a corrupção, imputando responsabilidades e sanções às pessoas jurídicas. O objetivo claro desta lei foi o de atingir fortemente os corruptores, impondo-lhes pesadas sanções, tanto administrativas quanto pecuniárias.  

Também é importante destacar que a Lei 12.846/13 determina que as pessoas jurídicas serão responsabilizadas objetivamente pelos atos de corrupção praticados pelos seus prepostos. Assim, não caberá, como matéria de defesa, a alegação de que a sociedade desconhecia a prática ilegal cometida por seu colaborador. Havendo a comprovação do ato, do dano e do nexo entre eles, a sociedade poderá ser responsabilizada.

E a lei determina o que é um ato de corrupção? Sim, mas de maneira muito ampla: “atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, para fins desta Lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1º, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos assumidos pelo Brasil”. A Lei ainda relaciona uma série de condutas específicas que podem ser consideradas como atos de corrupção. Porém, ainda assim há muita subjetividade neste enquadramento. Inclusive a promessa ou oferta de valores ou vantagens também são consideradas como um ato de corrupção. 

E, comprovada a prática do ato, as penalidades impostas por esta lei são pesadas: aplicação de multa que pode variar de 0,1% a 20% do faturamento bruto da sociedade penalizada no exercício anterior à instauração do processo administrativo, nunca inferior à vantagem auferida. Existem também penalidades administrativas, com forte impacto na imagem da sociedade condenada: obrigação de publicação extraordinária da decisão condenatória em formato de extrato de sentença em meio de comunicação de grande circulação, em edital afixado no local de exercício da atividade da sociedade e em seu site.

Ora, inegável é que as sociedades devem ter em sua essência a orientação para que seus colaboradores apresentem conduta pautada no cumprimento das leis. Porém, sociedades são feitas de pessoas, indivíduos com vontades próprias, que muitas vezes possuem liberdade em sua forma de atuação, mesmo que em nome da sociedade. Neste sentido, a sociedade sempre estará exposta a condutas desvirtuadas de seus colaboradores. Cabe-lhe tomar todas as medidas que a lei lhe assegura se proteger. E quais são estas medidas? O que a sociedade pode fazer para mitigar estes riscos?

A resposta é direta e é dada pela própria Lei: a implementação de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia, além de aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta poderão servir como atenuantes na aplicação das sanções. Ou seja: a existência de um Programa de Integridade é essencial para a existência e proteção da sociedade, independentemente de seu tamanho ou de seu faturamento.

E o que é o Programa de Integridade, também conhecido como Programa de Compliance? De forma abrangente, o Programa de Integridade deve expressar os valores éticos e morais dos sócios, sendo composto pela materialização das regras e dos valores éticos da sociedade. O seu conteúdo deverá servir de norte para as condutas dos sócios, funcionários e colaboradores em geral. 

Desta forma, investimentos neste campo são plenamente justificáveis, na medida em que as pesadas sanções impostas pela legislação podem ser fatais para a continuidade do negócio. A verdade é que o Programa de Integridade é a forma mais eficaz de proteção da sociedade e deve obrigatoriamente estar no radar da alta direção. Se a sociedade ainda não o possui, este assunto deve ser levado à discussão imediatamente.

O Decreto nº 8420/15, que regula a Lei Anticorrupção, traz um Capítulo inteiro sobre o Programa de Integridade, valendo a leitura de cada linha para sua elaboração. Não há um modelo a ser seguido, uma vez que cada sociedade possui seus valores éticos e morais, no entanto, destacamos cinco pontos que farão com que o Programa de Integridade efetivamente atinja seus principais objetivos: nortear a conduta dos colaboradores e proteger a sociedade. 

  1. a) O Programa deve disponibilizar um canal de denúncias; 
  2. b) O Programa deve ser top down, ou, seja, cumprimento e engajamento devem vir da alta direção para os demais; 
  3. c)  O Programa deve atingir todos, sem qualquer distinção; 
  4. d) O Programa deverá ser objeto de constante treinamento, aperfeiçoamento e adaptação; 
  5. e) O Programa deve ser tutelado por um agente interno independente, o Compliance Officer.

Importante também destacar que, antes do desenvolvimento do Programa, recomenda-se uma avaliação de riscos – risk assessment, entendendo os pontos operacionais em que a sociedade está mais exposta a ocorrência de fraudes e atos de corrupção. De posse destas informações, a sociedade poderá criar suas regras e políticas internas que passarão a guiar as condutas dos sócios e demais integrantes da sociedade com maior efetividade.

Por fim, mas não menos importante, mais do que a criação e implementação do Programa, recomenda-se seja garantido o conhecimento e a aplicação das normas nele contidas, por todos, sem distinção: o Programa não pode existir somente no papel. Se assim  for, ele não cumprirá sua função em nenhum aspecto, e, sobretudo, não protegerá a sociedade caso, infortunadamente, algum colaborador venha a praticar algum ato de corrupção, trazendo imensuráveis prejuízos – financeiros e morais – para toda a sociedade.

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por Carolina Kantek
*edição por Luiza Guimarães
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*Luiza Guimarães é mestre em Comunicação Social pelo PPGCOM da Universidade Federal do Paraná, especializada em Jornalismo Internacional Digital pela Université Lumière Lyon 2, na França. Formada em Comunicação Social, com habilitação em jornalismo, também pela UFPR.

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