SALA DE LEITURA

A pandemia e as mudanças na relação com o judiciário

por Luiza Guimarães*

A pandemia do Covid-19 afetou todas as áreas da sociedade. Na área jurídica não foi diferente. O trabalho remoto aumentou a eficiência do judiciário e todos, juízes, servidores e advogados, tiveram que se reinventar. Aspectos tradicionais, antes indispensáveis, se mostraram formalidades desnecessárias. Sistemas de videoconferência, que antes despertavam receio, agora são amplamente utilizados.

Mesmo assim, ainda existem desafios. Acesso e acessibilidade, audiências e a segurança de dados ainda são aspectos em debate. Para falar mais sobre as relações com o Poder Judiciário durante a pandemia, as advogadas da Pereira, Dabul, Carolina Kantek e Lires Ianoski, compartilharam suas percepções e experiências nestes últimos 3 meses de pandemia.

Durante os últimos meses, assim como os demais setores da sociedade, o judiciário precisou se reinventar. Quais foram as principais mudanças que vocês observaram neste período?

Carolina Kantek: Em casa, tanto os juízes, como os promotores e os servidores, conseguiram trabalhar com mais eficiência. Isso fez com que os processos andassem mais rápido e a gente tivesse uma movimentação mais eficiente. A gente fez mais coisas, trabalhou mais neste período. Em casa a gente vem observando que o trabalho está mais concentrado, o nosso e o dos servidores. Então o que parece é que o servidor, que antes ficava com trabalho represado no gabinete, e os próprios juízes, aproveitam esse período para colocar as tarefas em dia.

Lires Ianoski: Assim como os demais setores da sociedade nós também não estávamos preparados para o trabalho remoto por tanto tempo. Com a pandemia, da noite para o dia a gente precisou se reinventar. O mesmo aconteceu com o judiciário. No começo os prazos foram suspensos e vieram várias decisões conflitantes. No entanto, aos poucos, começamos a perceber um aumento na produtividade. Tudo passou a ser mais virtual do que nunca. Acredito que tudo aquilo que iria acontecer, mas mais lentamente, foi antecipado pela pandemia. O processo eletrônico, por exemplo, veio já há alguns anos e tivemos um período de adaptação. A pandemia não permitiu isso. Um dia você estava no escritório, no fórum ou no gabinete e, no dia seguinte, estava em casa, procurando as ferramentas necessárias para o trabalho remoto.

Vocês acreditam que o judiciário já estava preparado para essas mudanças?

Carolina Kantek: Eu acho que a gente já tinha um caminho bem estruturado por causa dos processos eletrônicos. Então eu acho que as mudanças não foram assim tão grandes, uma vez que já tínhamos muita coisa pronta. Do ponto de vista do poder judiciário, acredito que foi necessário um período pequeno de ajustes em relação a adaptação dos servidores ao home office. De fato, não houve uma grande mudança, pois o judiciário já estava preparado para trabalhar online. A gente precisou, sim, de um período de suspensão dos prazos, já que ninguém sabia quanto tempo a pandemia iria durar. Em questão de dias, porém, todo mundo já havia entendido que iria demorar bastante. Então acredito que a grande diferença foi para os advogados, que precisaram entender que é possível trabalhar online. 

Lires Ianoski: Na minha opinião o judiciário como um todo não estava 100% preparado. Alguns estados e tribunais saíram na frente porque já tinham implementado algumas tecnologias no dia-a-dia, mas essa não é a regra para todos. A parte de proteção de dados e padronização de plataformas foram os principais desafios. Não houve tempo de preparo para isso. Agora será preciso investir pesado nessa área.

Na opinião de vocês, quais mudanças vieram para ficar?

Carolina Kantek: Todos nós procuramos sempre ser mais eficientes. Quando saímos do processo físico e fomos para o eletrônico já tivemos um ganho imenso em eficiência. Antes, quando você precisava de uma liminar, você tinha que ir até os lugares, esperar e se deslocar. Tudo isso demandava um tempo enorme. Hoje não, em alguns cliques você já resolve. Então acredito que, com esse novo método de trabalho, essa eficiência veio para ficar. Agora que aprendemos a trabalhar de casa, podemos continuar assim.

Lires Ianoski: Eu acredito que o trabalho virtual e remoto economiza tempo e dinheiro. Existem vários dados e várias pesquisas que mostram um aumento da produtividade, principalmente nos tribunais, algo que a gente também repara no cotidiano. Os despachos são mais rápidos, os servidores estão produzindo mais. Então eu acredito que o trabalho remoto deva permanecer. A possibilidade de realizar sustentação oral, por exemplo, por videoconferência, tudo gravado com a possibilidade de consulta depois, são mudanças que vieram para ficar. Isso porque elas acabam colocando em prática o que a Constituição diz: o acesso do judiciário para todos. De uma maneira mais célere, mais barata e que possibilite que todos tenham os mesmos direitos. Claro, ainda existe muito mais para se adaptar.

Para quais mudanças talvez ainda não estejamos preparados?

Carolina Kantek: O que eu acho que ainda precisa ajustar um pouco é a questão das audiências. Algumas audiências de conciliação, as mais simples, estão acontecendo, já as audiências de instrução são um pouco mais complicadas. Elas têm uma questão de sigilo, na qual é preciso garantir que as testemunhas sejam ouvidas individualmente. No contexto atual ainda não é possível garantir que a pessoa, em casa, esteja realmente sozinha e não seja induzida por ninguém. Mas eu não tenho dúvida de que encontrarão uma forma. Os processos não vão parar por causa disso.

Lires Ianoski: Não podemos nos esquecer das diferentes realidades brasileiras. Existem regiões do país onde o sinal de Internet é fraco. Em alguns fóruns, os servidores não têm acesso à Internet de qualidade em casa. O mesmo se aplica para as partes do processo. Existem lugares que criaram um centro físico com acesso à Internet nos prédios dos fóruns para possibilitar o acesso aos julgamentos virtuais. Outras questões são a segurança da informação e as audiências nas quais é preciso que as pessoas testemunhem. Ainda existem problemas tecnológicos nessas áreas, mas estamos avançando. 

Quais serão os maiores desafios e as novas características que definirão a relação da sociedade e dos advogados com o judiciário daqui para a frente?

Carolina Kantek: Eu considero que a maior adaptação será para os advogados. A grande maioria de nós tinha um estigma de que não era possível fazer home office. Que era preciso estar no escritório, que era preciso ir ao cliente e receber o cliente. Eu sinto que isso vem diminuindo. Os escritórios entenderam que é possível, sim, fazer home office e isso é um ganho para todo mundo. Muito se fala da burocracia e da perda de tempo, principalmente quando relacionado ao poder judiciário e ao trabalho do advogado. Essa questão parece que será menor com o entendimento de que é possível trabalhar de casa. Há uma grande economia de tempo ao migrar para o online, o que torna o nosso trabalho mais eficiente.

Lires Ianoski: Estamos caminhando em direção a uma maior informalidade e isso é positivo. A objetividade, inclusive da linguagem do advogado, é muito importante. A comunicação longa e com excessos de formalismos não é compatível com o meio virtual. Além disso existe a questão da empatia. É preciso ter empatia no momento em que vivemos. Todos estão com questões pessoais para resolver, seja um problema com tecnologias, ou alguma doença na família ou um filho que não pode ir para a escola. Então essa colaboração e empatia tiram um pouco a animosidade que existia entre os advogados.

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*Comprometida com a democratização dos conceitos jurídicos a Pereira, Dabul Advogados Associados concede uma série de entrevistas para a jornalista Luiza Guimarães**. Em linguagem acessível, os artigos pretendem colocar em debate temas que preocupam o empresariado. 
**Luiza Guimarães é mestranda em Comunicação Social pelo PPGCOM da Universidade Federal do Paraná, especializada em Jornalismo Internacional Digital pela Université Lumière Lyon 2, na França. Formada em Comunicação Social, com habilitação em jornalismo, também pela UFPR.

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