SALA DE LEITURA

A flexibilização tributária para empresas durante a pandemia

*por Luiza Guimarães

A flexibilização tributária é uma das questões mais discutidas entre as empresas em 2020. Desde o decreto de calamidade pública, de 20 de março, uma série de portarias, decretos, instruções normativas e medidas provisórias foram publicadas. Essas ações foram tomadas pelo Governo Federal no intuito, principalmente, de minimizar os impactos da pandemia para as empresas e garantir a manutenção dos empregos.

Como essas medidas vêm funcionando na prática, quatro meses após suas publicações? Em entrevista, o advogado Gabriel Meister, da Pereira, Dabul, faz um panorama reflexivo do Direito Tributário em tempos de pandemia.

Já estamos desde março vivendo em estado de calamidade pública. A essa altura, temos algum dispositivo já previsto em lei para a flexibilização dos tributos?

Gabriel Meister: temos, mas essa flexibilização não pode ser entendida como uma forma de não-pagamento do tributo. No âmbito do Direito Tributário, as flexibilizações vieram por meio de portarias, resoluções e instruções normativas. Lá em março e abril, no início da pandemia aqui no Brasil, foram editadas algumas medidas provisórias para a manutenção do emprego e da atividade empresarial como um todo. Contudo, nós, da área tributária, também tivemos alguns reflexos. A MP 932/20, por exemplo, reduziu em 50% a alíquota da contribuição ao Sistema S. Essa medida provisória virou a Lei 14.025/20. Entretanto, quando foi aprovada a lei, o artigo 1º, do projeto de conversão em Lei, que previa a redução da alíquota de 50% foi vetado pelo Presidente. No meu entendimento, esse veto fez sentido neste caso, porque o artigo 1º previa a redução apenas para os meses de abril e maio. Isso ficava incongruente com aquilo que a MP já tinha trazido, que era referente aos meses de abril, maio e junho. No entanto, a redução permanece válida para o período que vigorou a MP, tendo em vista que a ocorrência dos fatos geradores se deu em momento anterior ao da publicação da lei. 

Como exemplo da flexibilização em matéria tributária, posso citar os Decretos de nº 10.305/20 e 10.414/20, que reduziram para 0% a alíquota do IOF sobre as operações de crédito. As portarias do ME nº 139/20, 150/20 e 245/20, que prorrogaram os prazos de recolhimento das contribuições especiais da seguridade social de abril, maio e junho para os meses de agosto, outubro e novembro, respectivamente. Além das prorrogações de entrega de algumas obrigações acessórias como, por exemplo, a trazida pela IN 1.932/20, da prorrogação de validade das CNDs no âmbito da PGFN e da Receita Federal, conforme as Portarias Conjuntas de nº 555/20 e 1.778/20.

Tivemos, também, alguns tributos no âmbito do Simples Nacional com diferimento do prazo para pagamento prorrogado por 06 meses em relação aos tributos federais e 03 meses em relação ao ICMS e ISS, conforme Resoluções nº 152/2020 e 154/2020 do Comitê Gestor).

Além dessa medida, há outras medidas que reduziram as alíquotas de alguns tributos, como o IOF Tivemos também vários tributos cujos prazos foram prorrogados. Na maioria dos casos, os prazos que venceriam de abril a junho passaram a vencer de outubro a dezembro de 2020.

Foram muitas prorrogações e medidas que parecem tentar evitar prejudicar a população. Você acredita que essas medidas são suficientes?

Gabriel Meister: o foco inicial do Governo não era tanto a questão tributária, mas a manutenção dos empregos e da atividade empresarial. No âmbito tributário, eu acredito que essas medidas até então implementadas ainda se mostram singelas. Postergou-se o pagamento de alguns tributos, é verdade, mas tal medida apenas joga para frente a dívida. Apesar do Governo trabalhar na liberação de crédito para as empresas, há que se considerar a redução da própria atividade empresarial, por conta, inclusive, da ausência de funcionários decorrente das restrições impostas pelo Ministério da Saúde ou por leis estaduais e municipais. Isso certamente nos dá a entender que outras medidas mais drásticas precisariam ser tomadas pelo Governo em matéria tributária para facilitar a retomada da atividade empresarial, ante a queda brusca de faturamento daquelas empresas afetadas pela pandemia.

Na sua opinião, quais seriam os principais desafios das empresas em matéria tributária daqui para a frente?

Gabriel Meister: As empresas trabalham no sentido de buscar oportunidades, inclusive com base nos entendimentos firmados pelo Poder Judiciário nos últimos anos. Como exemplo, posso citar a decisão proferida pelo STJ em relação ao conceito de insumos para tributação pelo PIS e COFINS. Há que se destacar também que recentemente o STJ sumulou o entendimento acerca da extensão do benefício do Reintegra às vendas realizadas à Zona Franca de Manaus, entre outras.

Além disso, nós temos trabalhado para revisitar algumas teses que, no passado, não se mostravam tão necessárias para a situação como um todo, mas que atualmente algumas empresas têm requerido e questionado se a tese é viável ou não. 

Não fosse apenas isso, fato é que o Governo Federal poderia tomar outras medidas para facilitar a retomada das atividades. Uma medida drástica, mas efetiva, seria a suspensão imediata de parcelamentos tributários. O que vimos até agora foi só o diferimento, ou seja, jogar para a frente o pagamento dessas parcelas. 

Poderia ser tomada, também, uma medida para a facilitação de substituição de garantias de processos. Muitas empresas têm dinheiro depositado judicialmente para a garantia de créditos tributários ou da União. Poderia existir uma lei ou ato normativo que permitisse que esse dinheiro fosse substituído por um bem, por uma carta de fiança ou por algo que fosse menos danoso para a empresa neste momento. 

Diante de tudo que as empresas têm enfrentado hoje, elas acabam pegando créditos de um lado e usando-os para pagar os tributos do outro. Entendo que uma concessão de uma moratória mais ampla, com prazos dilatados nos âmbitos Federal, Estadual e Municipal, deveria também ser considerada. Assim, o dinheiro que a empresa usa para pagar os tributos neste momento, ela utilizaria para o pagamento dos funcionários e para a contratação de novos funcionários com objetivo de acelerar este processo de recuperação.

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*Comprometida com a democratização dos conceitos jurídicos a Pereira, Dabul Advogados Associados concede uma série de entrevistas para a jornalista Luiza Guimarães**. Em linguagem acessível, os artigos pretendem colocar em debate temas que preocupam o empresariado. 
**Luiza Guimarães é mestre em Comunicação Social pelo PPGCOM da Universidade Federal do Paraná, especializada em Jornalismo Internacional Digital pela Université Lumière Lyon 2, na França. Formada em Comunicação Social, com habilitação em jornalismo, também pela UFPR.

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